Por Vitor Bukvar Fernandes
O Brasil foi descoberto em 1500 e o conflito de terras vem ocorrendo desde a divisão do território da nova nação. Até hoje, o emaranhado de regras, leis e as lacunas deixadas pela falta de controle sobre o uso e a ocupação do solo tornam o país uma verdadeira “terra de ninguém”.
Na recente edição do Seminário Internacional de Governança de Terras e Desenvolvimento Econômico: Regularização Simplificada, realizada na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), temas relevantes foram debatidos e ficou patente a necessidade urgente de promover uma ampla regularização de terras no país que se baseie em regras claras e na aceleração dos processos.
O objetivo é que todos saibam quem está em cima da terra e o uso que se dá a cada palmo de chão no Brasil e, assim, garantir a segurança jurídica. Ter uma política certa de governança de terras é uma questão de soberania nacional.
Na última década, a preocupação com a compra de milhares de hectares de terras no Brasil por estrangeiros passou a fazer parte da pauta de discussões. Sem um controle mais efetivo, é difícil identificar se são brasileiros ou estrangeiros quem está por trás, por exemplo, de empresas em regime de sociedade anônima (S/A) que adquirem as áreas.
A legislação existente no país tem problemas graves e ainda há muito espaço para melhoras. Há uma concordância de que é necessário promover mudanças. Mas não adianta, simplesmente, criar regras que proíbam a compra ou a venda de terras. O país precisa promover uma mudança de visão. É necessário compreender que a terra é, simultaneamente, um ativo produtivo e um ativo líquido. Em qualquer parte do mundo é assim.
A governança de terras é a saída para garantir regras claras de uso e ocupação do solo. As normas vão impor direitos e deveres para os proprietários de áreas no Brasil – sendo eles brasileiros ou estrangeiros. Em conjunto, o país deverá estabelecer mecanismos que freiem uma invasão de estrangeiros comprando terras brasileiras.
Se o país tiver uma boa governança, garantirá um controle das terras, terá conhecimento de quem são os donos dos imóveis e poderá monitorar o uso que os proprietários fazem de cada área. As medidas para definir a melhor governança passam pela legislação mais adequada para a realidade brasileira, a elaboração de um cadastro nacional de imóveis, o georreferenciamento das áreas urbanas e rurais, a simplificação dos processos burocráticos que envolvam órgãos e cartórios e a articulação de agentes públicos e privados.
Ter, de fato, a soberania da terra brasileira é fundamental para o desenvolvimento econômico, social e ambiental do país. Conhecer bem a nossa terra também permitirá reduzir os conflitos que resultam em violência no campo e nas cidades. Assim, também será possível barrar a especulação imobiliária e a grilagem de terras.
O governo e a sociedade terão ainda instrumentos para evitar o desmatamento das florestas e para coibir as irregularidades na posse de terras no país. A governança de terras é uma questão complexa no Brasil. E, o futuro do país passa pela organização do uso e da ocupação do solo. Em um ano de eleição nacional, o tema deve estar na pauta de debate dos presidenciáveis e da sociedade.
*Doutor em desenvolvimento econômico pela Unicamp, professor da Unesp - Rio Claro e pesquisador do Grupo de Governança de Terras (GGT) do Instituto de Economia (IE) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).