Por João Baptista Herkenhoff*
Sou a favor da Vida. Contra a pena de morte e a guerra.
A favor de políticas públicas que favoreçam o parto feliz e a maternidade protegida.
Contra a falta de saneamento nos bairros pobres, causa de doenças e endemias que produzem a morte.
Discordo da percepção limitada, embora possa ser honesta e sincera, dos que reduzem a defesa da vida à proibição do aborto quando, na verdade, a questão é muito mais ampla.
Abomino a hipocrisia dos que sabem que a defesa da vida exige reformas estruturais, mas resumem o tema a um artigo de lei porque as reformas mexem com interesses estabelecidos e ofendem o deus dinheiro.
Sou contra o pensamento dos que não admitem o aborto nem quando é praticado por médico para salvar a vida da mãe, porém aceitariam essa opção dolorosa se a parturiente fosse uma filha.
Sou contra a opinião que obscurece as medidas sociais, pedagógicas, psicológicas, médicas que devem proteger o direito de nascer.
Reprovo a opinião dos que lançam anátema contra a mulher estuprada que, no desespero, recorre ao aborto quando, na verdade, essa mulher deveria ser socorrida na sua dor. Se não tiver o heroísmo de dar à luz a criança gerada pela violência, seja compreendida e perdoada.
Hoje eu debato esta questão doutrinariamente. Quando fui Juiz eu me defrontei com o aborto em concreto.
Lembro-me do caso de uma mocinha. Quase à morte foi levada para um hospital que a socorreu e comunicou depois o fato à Justiça.
O Promotor, no cumprimento do seu dever, formulou denúncia que recebi.
Designei interrogatório.
Então, pela primeira vez, eu me defrontei com o rosto sofrido da mocinha. Aquele rosto me enterneceu, mas não havia ainda nos autos elementos para uma decisão.
Designei audiência e as testemunhas me informaram que a acusada tinha o costume de toda noite embalar um berço vazio como se no berço houvesse uma criança.
No mesmo instante percebi o que estava ocorrendo. Nem sumário de defesa seria necessário. Disse a ela, chamando-a pelo nome:
"Madalena (nome fictício), você é muito jovem.” Sua vida não acabou. Essa criança, que estava no seu ventre, não existe mais. Você pode conceber outra criança que alegre sua vida.
Eu vou absolvê-la, mas você vai prometer não mais embalar um berço vazio como se no berço estivesse a criança que permanece no seu coração.
Eu nunca tive um caso igual o seu. Esse gesto de embalar o berço mostra que você tem uma alma linda, generosa, santa.
Você está livre, vá em paz. “Que Deus a abençoe."
*É juiz de Direito aposentado (ES), palestrante e escritor.
E-mail – [email protected]
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