Para delegado, tragédia na Kiss revolucionará entretenimento

Para delegado, tragédia na Kiss revolucionará entretenimento Notícia do dia 28/02/2013

Marcelo Mendes Arigony, 40 anos, está perto de concluir o maior e mais difícil desafio de seus quase 14 anos de carreira na Polícia Civil. Titular da Delegacia Regional de Santa Maria, ele é o homem à frente das investigações sobre a tragédia na boate Kiss, atingida por um incêndio que vitimou 239 pessoas no dia 27 de janeiro.

A investigação que apura as causas e os possíveis responsáveis pelo desastre que dilacerou famílias e enlutou o Brasil está perto de ser concluída. O prazo de envio do inquérito à Justiça se esgota no domingo, 3 de março. Mas a polícia não descarta pedir a prorrogação. Ainda não estão prontos os laudos da perícia, que devem comprovar a tese da polícia de que houve homicídio doloso qualificado no caso. 

O documento já soma quase 4 mil páginas e o volume pode dobrar. Trata-se “do maior inquérito da história” da Polícia Civil gaúcha, nas palavras do próprio Arigony. Além do resultado de inúmeras perícias, de papéis e provas apreendidas, nele consta o depoimento de mais de 500 pessoas. São testemunhos de sobreviventes, de bombeiros que participaram do resgate, de autoridades e responsáveis pela fiscalização e concessão de alvarás no município, entre outros envolvidos direta ou indiretamente no caso. 

Natural de Santa Maria, Arigony tem envolvimento pessoal na tragédia. A prima dele, Sabrina Mendes, de 18 anos, foi à Kiss naquela noite e não saiu de lá com vida. Mas por pouco o desastre não passou ainda mais perto da vida do delegado. A filha dele, Ana Luiza, também poderia estar dentro da Kiss quando o incêndio selou o destino de mais de duas centenas de jovens naquela madrugada.

Na quinta-feira anterior à tragédia, a jovem completou 18 anos. A família discutiu se comemoraria na sexta-feira ou no sábado. A opção foi pelo primeiro dia e, após um churrasco na casa de Arigony, ela foi com os amigos na Absinto (cujo proprietário é Mauro Hoffmann, também sócio da Kiss). No dia seguinte, a única opção noturna seria a Kiss.

Por conta da proximidade com os fatos investigados, houve dúvidas sobre a capacidade do delegado de conduzir o inquérito de forma imparcial. Ele chegou a se emocionar quando se dirigia a um grupo de estudantes, que clamavam por justiça em um protesto na porta da Delegacia Regional, na terça-feira seguinte ao incêndio.  

O delegado também foi alvo de críticas por postar no Facebook uma foto de um show pirotécnico dentro da Kiss, com a frase “tirem suas próprias conclusões”. A publicação foi retirada da página horas depois. Em entrevista coletiva nos dias seguintes, ele afirmou que seria o primeiro a se declarar impedido de conduzir as investigações sobre a tragédia na Kiss caso assim se sentisse.  

Na madrugada do dia 27 de janeiro, Arigony aproveitava os últimos dias de férias quando foi acordado com a notícia do incêndio na Kiss. Preocupou-se imediatamente com a filha, mas se tranquilizou ao falar com ela por telefone e se dirigiu à porta da boate em seguida. Chegou lá por volta das 5h. Desde então, ele dorme de três a cinco horas por dia e não tem mais vida social. Rotina que ainda pode se prolongar por até um mês, na parte final das investigações, como ele detalha na entrevista a seguir.


Felipe Truda

Do G1 RS, em Santa Maria

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