João Baptista Herkenhoff*
A cidade é a morada de grande parte dos seres humanos, neste novo milênio. Mas a cidade não é uma entidade abstrata, alheia às injustiças estruturais que massacram grande parte da humanidade.
Não existem grandes problemas na cidade para os que podem habitar uma residência condigna, locomover-se de carro ou em transporte coletivo de qualidade, ter acesso aos serviços essenciais – educação, saúde etc. O problema das cidades é o problema dos que são excluídos da cidade.
A humanidade alcançou padrões de tecnologia que poderiam assegurar a todos os seres humanos o direito de reclinar a cabeça num leito, ao final de cada dia, habitando uma morada digna da grandeza infinita do homem.
Quem está fora da cidade? Quem foi expulso dos espaços nobres para conviver com o lixo e viver do lixo?
São pessoas sem nome e sem face, embora portadoras da mesma substância espiritual que nos irmana a todos.
Milhões de crianças estão abandonadas nos guetos das grandes cidades do mundo, especialmente no Hemisfério Sul. Há presença maior de mulheres do que de homens nas favelas. Também as discriminações raciais desenham o quadro geográfico de uma cidade. Exceções à parte, não se reserva aos brancos o pior espaço urbano.
Ainda são habitantes preferenciais dos lugares imprestáveis, no conjunto do espaço urbano, outras espécies de oprimidos e marginalizados: o apátrida, o refugiado, o que vive em terra estranha, o migrante; os portadores de retardamento mental; os portadores de deficiências em geral.
O fenômeno da exclusão não é casual, nem resulta de uma suposta seleção que um caduco darwinismo social teima em sustentar ainda hoje. O fenômeno da exclusão resulta do aniquilamento do Direito, da negação da Justiça, da desumanização das condutas, do esmagamento da Ética.
*Magistrado aposentado (ES) e escritor
E-mail: [email protected]