João Baptista Herkenhoff*
Não deve causar estranheza o fato de igrejas cristãs se unirem em defesa de causas sociais.
Essa partilha intereclesial está ocorrendo em Vitória, neste conturbado junho de 2019, conforme registrado pela imprensa.
Tenho a alegria de constatar que um dos participantes da caminhada pela paz foi meu aluno no Curso de Direito da UFES. Trata-se do Padre Kelder Brandão.
Esse sacerdote, num pretérito Sete de Setembro, foi um dos organizadores do Grito dos Excluídos, que ocorreu em Terra Vermelha, na periferia da Capital.
Voltemos ao início deste artigo quando me referi à união de igrejas cristãs na luta em favor de Justiça e Paz.
Segundo o relato bíblico, no julgamento final, Jesus Cristo não chamará as pessoas para o lado dos escolhidos, segundo um determinado timbre ou rótulo religioso, mas segundo as obras:
“Vinde a mim, benditos de meu Pai, que me deste pão quando tive fome; tive sede e me destes de beber; era peregrino e me acolhestes; nu e me vetistes; enfermo e me visitastes; estava preso e viestes a mim”.
Quando fui juiz de Direito, os desembargadores que melhor entenderam meu trabalho e minhas ações eram espíritas: Carlos Teixeira de Campos e Mário da Silva Nunes. Graças principalmente ao apoio deles, consegui resistir.
Uma decisão que proferi libertando uma pobre prostituta, envolvida com drogas, porque ela seria Mãe, tornou-se nacionalmente conhecida em razão da divulgação dessa sentença pela internet, num site espírita.
Transcrevo a seguir um pequeno trecho do decisório.
“É uma dupla liberdade a que concedo: liberdade para Edna e liberdade para o filho de Edna que, se do ventre da mãe puder ouvir o som da palavra humana, sinta o calor e o amor da palavra que lhe dirijo, para que venha a este mundo tão injusto com forças para lutar, sofrer e sobreviver.
Este Juiz renegaria todo o seu credo, rasgaria todos os seus princípios, trairia a memória de sua Mãe, se permitisse sair Edna deste Fórum sob prisão.
Saia livre, saia abençoada por Deus, saia com seu filho, traga seu filho à luz, que cada choro de uma criança que nasce é a esperança de um mundo novo, mais fraterno, mais puro, algum dia cristão.”
Os espíritas compadeceram-se de Edna e entenderam porque o juiz a libertou, ainda que, naquele momento histórico (1976), fosse a droga considerada, mesmo o simples consumo, um crime gravíssimo. Através de flagrantes de droga eram colhidos pela rede de prisões muitos opositores da ditadura então vigente.
*Juiz de Direito aposentado (ES) e escritor
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Site: www.palestrantededireito.com.br