Há 125 anos, Lei Aúrea, reivençao do trabalho escravo no Brasil

Notícia do dia 13/05/2013

A cada ano, milhares de trabalhadores pobres são recrutados para trabalhar em fazendas, carvoarias, canteiros de obras e oficinas de costura e, posteriormente, submetidos a condições degradantes de serviço ou impedidos de romper a relação com o empregador. Não raro, permanecem sem poder se desligar do empregador até que terminem a tarefa para a qual foram aliciados, sob ameaças que vão de torturas psicológicas a espancamentos e assassinatos. No Brasil, essa forma de exploração é chamada de trabalho análogo ao de escravo, escravidão contemporânea ou nova escravidão, prevista como crime no Código Penal (artigo 149), com pena de dois a oito anos de reclusão.

Sua natureza econômica difere da escravidão da Antiguidade clássica e daquela que aqui existia durante a Colônia e o Império, mas o tratamento desumano, a restrição à liberdade e o processo de ?coisificação? são similares. O número de trabalhadores envolvidos é relativamente pequeno se comparado com a população economicamente ativa, porém não desprezível: de 1995 ? quando o sistema de combate ao trabalho escravo contemporâneo foi criado pelo governo federal ? até hoje, mais de 44 mil pessoas foram resgatadas dessa situação, de acordo com dados do Ministério do Trabalho e Emprego.

A produção capitalista necessita de espaços não capitalistas para se desenvolver. Em função de sua natureza, não admite limitações na aquisição de matéria-prima e na criação de mercados. Vale lembrar que ao longo de séculos, países e corporações têm ido à guerra por esse motivo. Em um curto espaço de tempo, de acordo com uma sinalização de demanda no Extremo Oriente, empreendimentos agropecuários no interior da Amazônia são capazes de se expandir sobre áreas, na maioria das vezes, ocupadas por populações que vivem sob outro modo de produção. Em questão de anos, surgem grandes fazendas de gado, lavouras de soja, algodão e cana-de-açúcar, além de carvoarias, produzindo matéria-prima e gêneros alimentícios, onde antes viviam populações indígenas, camponeses, comunidades quilombolas ou ribeirinhas.

Nessa expansão, podem coexistir tecnologia de ponta e formas ilegais de trabalho. O que parece contraditório na verdade expressa um processo fundamental para o desenvolvimento desses empreendimentos, acelerando sua capitalização e garantindo a capacidade de concorrência.

A utilização de trabalho escravo contemporâneo não é resquício de modos de produção arcaicos que sobreviveram provisoriamente à introdução do capitalismo, mas sim um instrumento utilizado pelo próprio capital para facilitar a acumulação em seu processo de expansão. A superexploração do trabalho, da qual a escravidão é sua forma mais cruel, é deliberadamente utilizada em determinadas regiões e circunstâncias como parte integrante e instrumento do capital. Sem ela, empreendimentos mais atrasados em áreas de expansão não teriam a mesma capacidade de concorrer na economia globalizada.

Há condições sociais que facilitam a disponibilização de mão de obra para essa pilhagem constante da força de trabalho. Em verdade, elas são consequências da existência do velho e bom exército de reserva de mão de obra, que resulta da progressiva redução da participação relativa do trabalho na composição do capital, mas também do processo de grilagem e expulsão de posseiros e de outras populações tradicionais de suas terras na região de fronteira agrícola amazônica ? frequente durante o regime militar nas décadas de 1970 e 1980 e que se mantém ainda hoje ? que serve tanto para aumentar o contingente de mão de obra para o campo e as cidades, quanto para ampliar os territórios dos empresários.

Isso, estruturalmente, gera um excedente alijado de meios de produção e emprego, diminuindo o valor de mercado a ser pago por um serviço. Os trabalhadores são impelidos a aceitar a oferta de serviço do ?gato?, mesmo não recebendo garantias de que as promessas dadas no momento do recrutamento serão cumpridas. Baseado nesse contexto de fragilidade social, o empreendedor pode utilizar a mão de obra necessária pagando o montante que desejar. Que pode ser praticamente nada no caso do trabalho análogo ao escravo.

As propriedades rurais mais atrasadas do ponto de vista tecnológico tendem a compensar essa diferença por meio de uma constante redução da participação do ?trabalho? no seu custo total. Simulam, dessa forma, uma composição orgânica do capital de um empreendimento mais moderno, em que a diminuição da participação do custo do trabalho se dá através do desenvolvimento tecnológico. Traduzindo para o português: há fazendeiros que retiram o couro do trabalhador para poder concorrer no mercado. Outros se aproveitam dessa alternativa não para gerar competitividade, mas para capitalizar-se durante um período de tempo (e depois trocar trabalhadores por colheitadeiras) ou aumentar sua margem de lucro.

 

Leonardo Sakamoto texto e foto

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